Feira do Livro

Chuva e discussões sobre literatura na internet e racismo marcam o quarto dia da Feira do Livro de Santa Maria

Fotos: Ronald Mendes



O Theatro Treze de Maio foi um bom abrigo para a chuva que, após um fim de semana de sol, mesmo fraca, deu as caras na 50ª Feira do Livro de Santa Maria. O palco centenário recebeu o público para o espetáculo “Lógica Ltda”, da Ilógica Cia, no início da tarde, a roda de conversa “Santa Maria no Multiverso da Leitura”, e mais uma sessão do espaço Livro Livre. “Sankofa: não vamos falar de nossas cicatrizes” prestou uma homenagem aos 20 anos de lançamento do livro “Os Problemas de Júnior”, da escritora Maria Rita Py Dutra.

Mas a chuva não espantou o público da Praça Saldanha Marinho que, praticamente toda coberta, estava lotada de leitores buscando novas histórias nas 32 bancas de livros disponíveis. A Cia. Armazém seguia com suas intervenções poéticas e o Espaço Infantil recebeu grande público. Os pequenos brincavam, coloriam e, claro, liam e ouviam aventuras literárias.


No Dia do Trabalho, o espetáculo "Lógica Ltda", da Cia Ilógica, abordou a temática de forma divertida

REAL E DIGITAL

Às 17h, com mediação do publicitário e criador de conteúdo Lúcio Pozzobon, Denys Schmitt, Laura Coelho, Natássia Gabaia e Vitória Damian se reuniram para um bate-papo sobre as possibilidades de divulgação, o contato e recepção do público leitor com criadores de conteúdo literários e de entretenimento na internet.

O produtor editorial Denys Schmitt, de 28 anos, também é um jovem escritor. Ele lançou seu primeiro livro, “A Estrada do Infinito”, em 2021, na Amazon. Ele conta que as palavras o acompanham desde criança:

– Eu acho que esse é um dos eventos mais marcantes para nós que trabalhamos com a área da cultura, então é sempre bom retornar à feira e sempre com chuva, né? Porque todo ano tem uma chuvinha na feira. Eu tenho alguns contos publicados em coletâneas e agora, mês que vem, vou um novo conto de forma independente. Eu fiz o curso de Produção Editorial justamente para me especializar um pouco na questão do mercado editorial.


É a saga “Percy Jackson e os Olimpianos”, do escritor norte-americano Rick Riordan, que mais inspira o trabalho de Denys com literatura. Hoje em dia, ele produz conteúdos para a rede social TikTok sobre os livros que narram aventuras inspiradas na rica mitologia grega. Embora ele esteja mais voltado para o mundo digital, o escritor acredita que a Feira do Livro potencializa a literatura de forma geral.

- Eu acredito que não exista uma divisão tão grande entre os livros físicos e os digitais. Eu penso que autores independentes, que só publicam e-books, também podem estar aqui na feira divulgando, por exemplo. Não temos um livro físico, mas temos matérias impressos como marcadores de página e postais. Tudo anda junto. Então podemos estar ocupando esse espaço também para divulgar nosso trabalho.

Em um momento do painel, alguns participantes levantaram a discussão de que faltariam espaços para a cultura em Santa Maria. Dona Ruth Peréyron, diretora do Theatro Treze de Maio, que acompanhava atentamente na plateia, interveio, apontando que existem, sim, muitos locais e eventos culturais em Santa Maria, como o próprio espaço que recebia o bate-papo. 


O produtor e escritor Denys Schmitt (ao centro) falou sobre o seu ingresso no universo literário da rede social TikTok


Vitória também apontou que muitos amigos e seguidores não sabiam que estava ocorrendo a Feira do Livro na cidade, por exemplo, o que levantou novas discussões sobre os nichos literários e de informação ocupados hoje em dia por leitores e não-leitores.

Sobre a  polêmica, Denys Schmitt apontou que, tanto os criadores literários podem se informar mais como eventos culturais devem ser mais divulgados:

- Eu acredito que a gente tem, sim, espaços culturais. Eu acho que funciona quando a gente tem a informação sendo difundida e também quando vamos atrás dela. Porque, às vezes, falta também da nossa parte buscar informação e reconhecer outros espaços de cultura que vão além do nicho em que estamos inseridos – finalizou o escritor.

HISTÓRIA

Já às 19h, o espetáculo “Sankofa: não vamos falar de nossas cicatrizes”, no Livro Livre, encerrou o quarto dia da feira da Feira com homenagem à escritora Maria Rita Py Dutra. O evento também celebrou o 20º aniversário de publicação do livro “Os Problemas de Júnior”, escrito por ela. A história foi publicada pela primeira vez em 13 de maio de 2003, coincidindo com a data do Centenário da Sociedade Cultural Ferroviária Treze de Maio, hoje denominada Museu Treze de Maio.

– É uma história infantil pequena, com 12 páginas. Minha primeira escrita, muito mais militante do que literária. Mas saiu e, desde então, tem contribuído muito para o debate sobre a questão racial. Quando eu escrevi, trouxe esse problema do discurso racista que acontece na sociedade ou na escola, mas que a mãe, a família, tem que resolver. O Júnior, de 4 anos, é chamado de negro e chega em casa chorando. Mas nem toda mãe, negra ou não, tem condições de resolver ou experiência nesse debate racial. Então o livro tem esse objetivo e importância.

O espetáculo trouxe apresentações de dança, como ritmos africanos e samba e também música. O objetivo era exaltar a ancestralidade negra que abriu caminho para se chegar aos 20 anos do livro “Os Problemas de Júnior”. Hudson Garcia, no saxofone, e Miguel Zanotelli, no piano, criaram, de improviso, uma música, em conjunto com a plateia. A letra da bossa nova falava que os problemas de Júnior ainda seguem atualmente. Em seguida, “Maria, Maria”, de Milton Nascimento, foi tocada em homenagem à Maria Rita Py Dutra, que assumiu o microfone no palco e refletiu sobre a questão racial na sociedade contemporânea.

- Eu fico muito feliz pela história. Ela reforça que nós precisamos que outras pessoas também escrevam sobre essa temática, que hoje está muito atual. Quando eu escrevi não era tanto, até porque produzimos de forma a atender a recém-sancionada lei da obrigatoriedade da educação racial nas escolas. Os professores precisavam desse material, por isso foi tão bem aceito.


A escritora Maria Rita Py Dutra celebrou os 20 anos de lançamento do livro "Os Problemas de Júnior" que trata de questões raciais

Maria Rita, que já foi patronesse de edição da Feira do Livro Infantil, se diz uma apaixonada pela leitura. Ela também exaltou as 50 edições do evento.

– Eu leio muito, então a feira sempre foi uma paixão para mim. Sempre participei desde quando estava na Casa do Poeta. É um território de conhecimento e de muita sabedoria e isso liberta, não é? É um espaço que gera alegria e movimento. Não tem coisa melhor do que ouvir o barulho da criançada e das escolas chegando para ter contato com leitura, assistir peças, me dá uma emoção muito grande – finaliza.

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